Caros leitores,
Naqueles dias das férias escolares de meio de ano, daquele ano de 1983, viajei para a fazenda. Levava um tesouro: uma fita cassete de Lulu Santos para tocar no TKR da F-75; era diversão desatolar pick-up carregada de cacau ouvindo “Um Certo Alguém”; era a era do Rock New Age! Passamos em Itabuna; no magnífico escritório do grupo Chaves ouvi, entre muitas conversas, a informação que o grupo tinha um milhão de sacos de juta ao custo de um dólar cada; ou seja, só em sacaria tinham de administrar um patrimônio de um milhão de dólares. Eu adorava o filé à cubana do restaurante Chão de Estrelas, e foi lá que almoçamos e conversamos muito sobre a dificuldade de administrar a sacaria; um saco parecia pouco, mas, era um milhão de dólares! Neste contexto, já na fazenda, tive, em minha vida, mais um sinal, um contato, com a cabeça das mulas-sem-cabeça. Tudo é história.
-É lá em Ilhéus que fazem isso! Agora tá voltando tudo assim; olha aqui. Indignado, Sr. Romarino, mostrava a sacaria.
-Quando descarrego na indústria eu vejo, tem uma mulherzinha (mostrou com a mão o tamanho) que trabalha com raiva, mete a faca sem pena. Complementou um caminhoneiro enquanto petiscava algumas amêndoas.
De uma hora pra outra a sacaria deixou de ser asseada e cuidada, virou um molambo. Voltava da moageira suja, cheia de pedaços de madeixa e marcada pelas desgraças humanas. Finalmente! Finalmente o “cérebro” tinha chegado às mãos. Finalmente as mulas começavam a agir, a materialidade da desgraça agora podia ser visualizada: um enorme corte na boca da sacaria formava uma cruz. Desde dia em diante para costurar um saco de cacau, era preciso duas madeixas; e ainda dar um ponto no enorme furo feito pelos classificadores, que só Deus pode explicar como, passou a usar um furão excessivamente grosso… pois é, e batiam o furão com raiva; algo, ou alguma idéia inculcada tinha tirado deles a consciência da delicadeza e responsabilidade do trabalho. Lembrei! Vocês conhecem a história de que quem casa com padre vira mula-sem-cabeça?
Um chefe de armazém era o senhor de seu ambiente de trabalho, sua relação com o dono era de confiança em tudo; qualquer um para entrar no armazém tinha de ter sua permissão; carregadores free lance só os de sua confiança; tudo era meticulosamente arrumado, limpo; até disputavam qual era mais organizado. Vi Sr. Romarino, enquanto pesava cacau, controlar, mandar, fiscalizar, contar, anotar, o trabalho de dez carregadores, dando carregado e enlonado quatro caminhões; agia como o maestro de uma estranha orquestra, mandava botar cuidadosamente sacos velhos nos degraus da escada para evitar escorrego, ao fim da sinfonia nem uma amêndoa de cacau sobrava esquecida na sarjeta. É estranho como vi tudo acontecendo, a sociedade continuava orgânica, vivíssima; no entanto uma peça tinha desencaixado lá em Ilhéus. … Enquanto eu tomava um suco pensava em pra quê cortar a sacaria daquele jeito, basta puxar a madeixa e cortar que não estraga nada; eu estava divagando.
– O senhor é Alex? Perguntou-me um jovem de paletó preto.
– Soubemos de suas lutas, sozinho; podemos ajudar? Continuou o jovem, enquanto eu apertava a mão dos demais.
Os sons sumiram, o cheiro gorduroso da lanchonete desapareceu, as pessoas apagaram, o tempo parou. Olhei para a Kombi, vi escrito “Sociedade Brasileira em Defesa da Tradição, Família e Propriedade”. Sorri o mais belo sorriso que dei nesta vida.
-Trazemos conhecimento, informação. E sempre que você precisar, podemos voltar aqui. Arrematou o jovem enquanto me entregava um livro autografado pelo líder da TFP Dr. Plínio Corrêa de Oliveira.
Fiquei nervosamente com o livro nas mãos, deixando as coisas voltarem; tomei o resto do suco; senti cheiros; devagar as pessoas aclararam; ouvi Nelson Ned cantando “Que tudo passa, tudo passará / E nada fica, nada ficará” … Como ficará uma sociedade que tem raiva de uma sacaria? O que passa na cabeça de uma pessoa que estraga um saco para agredir a quem? A si mesmo? A única certeza era de que o Grupo Chaves começava a perder um milhão de dólares.
As coisas foram passando, passando, a vida piorando, chegou à vassoura-de-bruxa, deu vassoura-de-bruxa no juízo de muita gente, e eu em Salvador curtindo as bailarinas do É o Tchan dançar a dança da cordinha; coisa mais bonita do mundo, gente! A cordinha descendo e as bailarinas cada vez mostrando mais, êta Deus bom! Vovó dizia “Quem muito abaixa a bunda mostra”, daí os preços na bolsa foram manipulados, desceu para 700 dólares à tonelada, as lideranças foram sendo liquidada a troco disso daquilo ou na marreta, as bocas caladas, até que no dia 22 de maio de 2002, às 9 horas o Conselho Nacional dos Produtores de Cacau reuniu-se e modificou seu estatuto… foi pretensão ao suicídio! Restou a Federação da Agricultura do Estado da Bahia que é igual a nada; terminou num jogo maligno de chamarem-se no diminutivo, e é abraço pra lá, abraço pra cá (lá ele!), um alisamento medonho; por fim a AIPC calou a FAEB. Faz o que quer; criou sua estrutura de doutrinamento; não aceita conversar com ninguém; sua proposta é sua razão; sua concessão é mediada por sua ONG capitão do mato; tudo que não for favorável a AIPC é proibido de falar, com cancelamento imediato; a CEPLAC virou cachorro morto nem vale a pena falar. Sabe onde isso termina? Na sacaria! Hoje a AIPC se auto intitula protetora, ensinadora, vendedora de tecnologia, dona da verdade, cobradora de “conversas de alto nível”, dona da câmara setorial do cacau, e etc… etc… etc… Legal. Entretanto não consegue sequer dar uma destinação correta para a sacaria usada! O CORONEL XELA está alertando vocês, a sacaria descartada indevidamente pode disseminar doenças.
AIPC vocês estão acendendo uma vela pra Deus e outras pra satanás, sem dialogo entre lideranças seus males também aparecerão; vocês estão intolerantes.
Coronel Xela.

Respostas de 2
Olá coronel Xela . Que bom , voltou ao Cacau , parabéns , tema importante , sacaria . Principalmente essa jogada fora por ter sido mau manipulada e transportada por essas empresas multinacionais no transporte do Porto a seus armazéns , com essa cacau podre vindo da África . Veja o perigo que estamos passando , lá na África com seus fungos e vírus endêmicos e não fazem mais o uso do brometo de metila , nos navios que trazem esse cacau para Ilhéus . Continue sim chamando atenção . Necessário repassar seu blog para que mais pessoas possam ler . Abrs
Deixa Keto, prezado Xela; é que a indústria gosta de brincar de “roleta russa”, adrenalina pura para eles.