Caros leitores,
Encontrei Dr. Raymundo Reis Júnior – não gosta de ser chamado de doutor- no Privê dos Curtidores, tradicional reduto dos apreciadores do uísque e sede da confraria “Quarta-feira nunca falto”. A entrevista durou duas horas e meia, falamos muito sobre orquídea; é um assunto prazeroso. Flamenguista (destes que só bebem chopp na caneca do Flamengo), colecionador, estudioso de orquídeas e bromélias, presidente da Associação Conquistense de orquidophilia, membro da Academia francesa de orquidofilia e finalmente, no tempo que sobra, é cirurgião dentista; a delicadeza no trato das plantas reflete em seu trabalho de cirurgião. Seu nome está em vários livros sobre orquídeas publicados em todo o mundo. “É uma doença, vírus puro; e contamina!” é assim que Raymundo Reis Júnior define a orquidofilia. Servido pelo amigo Preza, bebericando, comecei a entrevista:
Blog – É verdade que a orquídea é a última flor que apareceu na natureza?
Raymundo – Não! Está provado que a orquídea é muito antiga. Data de uns oitenta milhões de anos. Em um fóssil encontrado –arrumou o guardanapo representando o fóssil- um inseto com pólen aprisionou-se no âmbar. Achado recentemente pôde ser datado e o pólen confirmado como de uma orquídea; isso elucidou um mistério envolvendo o universo botânico. O incrível é que esse pólen aparenta-se com espécies amazônicas.
Blog – Cultivar espécies ou híbridos é só questão de gosto?
Raymundo – Temos no planeta 25.000 orquídeas espécie, aproximadamente; e mais de 30.000 híbridos, alguns híbridos naturais, claro. Bem mais híbridos foram criados pelo homem ao seu bel prazer, e bote prazer nisso! [risos] Tem até quem prefere cruzar orquídeas que se divertir cruzando… Nesses cruzamentos procura-se formas e cores. Tem o homem, nesse momento, a sensação de ser Deus, o criador. Cultivar espécie é tão prazeroso quanto cultivar híbridos, mas nada se compara a sensação de descobrir uma espécie nova, desconhecida da ciência. É o grande momento de um estudioso ou colecionador. Nesse momento ele se eterniza; entra para a história da botânica.
Blog – Fora do círculo dos colecionadores, qual a mais comercial; qual é a preferida dos consumidores: espécie ou híbrido?
Raymundo – Sem dúvida a mais comercial é a Phalaenopsis. E de quebra é a preferida dos consumidores, pois, além de ser muito bonita, cheia de cores, tem uma vida bem longa. Chega, uma haste floral, a ficar pungente por mais de três meses! Sabendo cultivar volta a florir no mesmo ano, novamente. É uma covardia. Para efeito de comparação, numa bela e graciosa catleya labiata (a flôr) tem no máximo trinta dias de vida, depois só no próximo ano. Lembrando que os phalaenopsis mais comercializados são os híbridos.
Blog – A proibição da comercialização da fibra do xaxin, gerou problemas no cultivo?
Raymundo – [com ênfase] No princípio sim.
Mas observou-se que o que estava havendo era um vício no cultivo com xaxim. Um excelente substrato, mas com um preço ambiental alto, devido ao extrativismo. Lembrando que acidificava com o tempo e o meio ficava ruim para as plantas. Vários outros substratos vieram a seguir, como: casca de côco, casca de pinus, cultivo em semi-hidropônia. O que vejo o melhor resultado é o uso da casca de macadâmia com sphagnum e brita. A macadâmia é uma planta introduzida e de cultivo fácil no Brasil.
Blog – Existem fazendeiros cultivando xaxim?
Raymundo – Não tenho conhecimento. As espécies de xaxim no Brasil são de crescimento lento. Hoje o xaxim consumido vem dos países do sul da América Latina.
Blog – A pingo de ouro e a Warnerii ainda te encantam?
Raymundo – [balançando a cabeça] Sim, sim, sim. Veja bem, orquídea é orquídea. Seja ela um simples e comum oncidium ou uma catleya Warnerii, antes tão comum nas matas da Bahia. Hoje é raro encontrar uma Warnerii na mata nativa, tanto que quando encontramos bate a saudade dos velhos tempos; do tempo em que na época da florada da Warnerii, seu perfume inundava as matas. Tempo bom…
Blog – Qual a dica para quem quer começar, ou melhor, padecer na paixão pela orquídea?
Raymundo – Ahhhh [abriu um sorrido enigmático] É saber logo se o cabra bebe [risos] É um vício parecido. Se, gosta de mulher? Vai terminar dividindo o tempo entre a esposa e a amante (a orquídea). Se entrar nesse universo, jogue fora a sua última esperança (de arranjar uma amante, mulher) estará perdido. [gargalhadas]
Blog – A Bahia tem bons, ótimos ou excelentes orquidófilos?
Raymundo – Excelentes. Taí uma coisa boa da Bahia: orquidófilos de excelência. Da velha guarda tem Edmundo Silva que tem muitas plantas descobertas e é grande cultivador. Da nova guarda tem o amigo Reinaldo, de Eunápolis e, claro, os colegas da Associação Conquistense de Orquidophilia e, Associação Orquidophila de Porto Seguro.
Blog – Como começou a Associação Conquistense de Orquidophilia?
Raymundo – Foi um convite de D. Nice. Uma visionária que acreditou que se reunisse um bando de “Orquidiotas” [muito riso. Preza! outra rodada, por favor] haveria de acontecer algo mais que um sonho. Deu certo. A associação é bem antiga. Dias 23, 24 e 25 de novembro, realizaremos mais uma feira e exposição de orquídeas. A orquídea é nosso lema… Tem hora que soa meio fresco; deixa pra lá…
Blog – Será coincidência que tantos homens gostem de orquídeas? Parece que esse padrão não se repete com outras flores.
Raymundo – Bicho, taí, a explicação é única… Observe porque tantos homens preferem orquídeas [sorveu um grande gole] vou falar: pegue uma orquídea; uma catleya. A orquídea se divide em sépalas, pétalas e labelo. O labelo é a parte mais bela, linda e misteriosa. No labelo temos a coluna. [outro grande gole] Se afastar as abas do labelo que tão delicadamente cobre a coluna, veremos que tão bela é a imagem formada, que perfeição; não se assemelha! é exatamente igual a, a, a, como digo, ao o que todo homem dá a vida para ver a de uma mulher! A visão do órgão reprodutor da orquídea, toda aberta, molhada, apta, é lindo! Lindo! Tem algum homem aí querendo ser orquidóphilo? [gargalhada]
Blog – Há mais coisas…
Raymundo – As bromélias
Blog – Das bromélias falamos de outra vez. Conheço um cidadão que olhando, apreciando o labelo da orquídea ficou meio lelé. O negócio é sério.
Raymundo – Bota sério nisso!
Fim.
Alex.
(Entrevista concedida na época da floração das Warnerii)