Entrevistei Waldeck Pinto de Araújo Júnior, por e-mail; são as facilidades da modernidade. Engenheiro, mestre em tecnologia, com especialização em gestão, servidor público de carreira concursado, foi chamado para o cargo de diretor-geral da CEPLAC pela ministra Tereza Christina. Aceitou o desafio de fazer a transição da CEPLAC para o futuro, e que desafio! Após um ano e seis meses de trabalho com dedicação integral e muitas realizações, apesar da pandemia,os ventos modernizadores já são sentidos; este é o mote desta entrevista. Tenham uma boa leitura.
Blog- A CEPLAC foi fundada com princípios tão modernos que serviu de inspiração na criação da EMBRAPA. Temos muito a aprender nesses princípios?
Waldeck- Os princípios que nortearam a criação da CEPLAC estavam dentro do contexto da época em que o agro no Brasil era menos desenvolvido, não existiam as tecnologias, as exigências nem as organizações de hoje. Atualmente existem muitas universidades e instituições de ensino voltadas para o agro, vários bancos ofertando linhas de crédito rural e muitas organizações governamentais e o SENAR realizando assistencia técnica. Mesmo a forma de captação de recursos que suportou a CEPLAC na época não existe mais. Assim cabe a CEPLAC se modernizar com foco na pesquisa da cacauicultura, constituindo uma rede de cooperação de várias instituições e difundindo tecnologia e conhecimento para fortalecimento dessa importante cadeia produtiva.
Blog- Você encontrou a CEPLAC destroçada, muitos destes princípios foram largados para trás, porém, perante o cacauicultor a CEPLAC tem bom conceito; quais valores você acentua nesta união?
Waldeck- A razão de ser da CEPLAC é o fortalecimento da cadeia produtiva do cacau, tendo como prioridade o produtor, que é o elo mais fraco dessa cadeia, representando menos de 8% do seu valor total. Dito isso, a ligação entre o produtor e a CEPLAC deve ser muito forte. O produtor, por meio das suas representações, deve ter voz ativa na definição das prioridades para a pesquisa e ser informado sobre o andamento dos projetos.
Blog- Isso é a volta do diálogo virtuoso. Então o cacauicultor poderá voltar a fazer encomendas de tecnologias?
Waldeck- Essas “encomendas de tecnologias” poderão acontecer de várias formas, desde a participação na governança até a contratação de pesquisas aplicadas, considerando o modelo de ICT (Instituto de Ciência e Tecnologia) que se aplica à CEPLAC.
Blog- Inclusive de cacau a pleno sol ou irrigado?
Waldeck- A CEPLAC já disponibiliza essa tecnologia, tanto no formato de cultivares desenvolvidos, como por meio de técnicas de manejo, porém continuamos buscando seu aprimoramento e expansão para outros biomas brasileiros como o cerrado.
Blog- Pode acontecer de tecnologias muito promissoras não serem aceitas pelos cacauicultores; a CEPLAC está preparada para conviver com situações assim?
Waldeck- Idealmente a CEPLAC deve disponibilizar um conjunto de cultivares, técnicas de manejo, bem como recomendações sobre onde e como poderão ser utilizados de acordo com as condições climáticas, ambientais e econômicas, porém, no final o risco do empreendimento é do produtor, dessa forma, a decisão sobre o que, como, quando plantar e qual tecnologia a ser adotada é dele, não cabendo essa decisão nem qualquer responsabilização futura à CEPLAC.
Blog- Como a CEPLAC pretende traduzir a “linguagem” usada nas pesquisas para uma “linguagem” que os cacauicultores entendam?
Waldeck- Esse é um grande desafio, mas acreditamos que a elaboração de cartilhas de boas práticas e manuais poderão ajudar muito. Iniciamos recentemente uma programação de “lives” e webinários que devem facilitar a disseminação de conhecimentos, principalmente se considerarmos que esse conteúdo fica gravado para acesso a qualquer tempo. Contamos com a ajuda das associações e representações dos produtores para nos solicitar materiais, enviar sugestões e nos apoiar nesse desafio.
Blog- A CEPLAC tem muita pesquisa abandonada, deixada de lado; sabemos que mentes arejadas, jovens, podem tirar muito proveito deste imenso acervo. Mentes desintoxicadas acham soluções rápidas. Bem, os jovens chegarão, como a CEPLAC lidará com essa nova realidade?
Waldeck- Existe uma grande expectativa por parte dos pesquisadores da CEPLAC em relação a essa renovação, inclusive para dar continuidade aos excelentes trabalhos de pesquisa já desenvolvidos e em desenvolvimento. Infelizmente a CEPLAC não foi bem-sucedida em conseguir realizar concursos nos últimos 33 anos, quando muitos concursos foram realizados no governo federal brasileiro. A solução é a construção de uma rede de pesquisa, com participação de vários ICT, empresas privadas, organizações nacionais e internacionais, para que de forma colaborativa possa desenvolver e aprimorar as tecnologias necessárias para a cadeia produtiva do cacau.
Blog- Seria então tipo um conselho. Acho enriquecedor! Foram os leigos cacauicultores que doaram vários clones resistentes à vassoura-de-bruxa. Até na medicina, leigos, fizeram descobertas a exemplo do óleo de lorenzo, cuja história é contada num filme. Você pode citar um exemplo atual de interação entre pesquisadores e leigos?
Waldeck- A aplicação prática das tecnologias pesquisadas sempre resulta em aprendizado para o produtor e o pesquisador, por outro lado alguns produtores também desenvolvem por si só materiais e técnicas de plantio e manejo que se tornam importantes levando a novas descobertas e linhas de pesquisa. Esse processo é vital para a evolução, mas parece ter se enfraquecido atualmente e deve ser reforçado.
Blog- Há muitos cacaueiros nativos nas várzeas da floresta amazônica e, provavelmente, tem alguma espécie ainda não conhecida. A CEPLAC pretende fazer alguma ação ou expedição de coleta, mesmo que a longo prazo?
Waldeck- A CEPLAC já fez várias coletas de material genético, que se encontra preservado no Banco de Germoplasma e replicado entre várias estações experimentais em diversos estados como Pará, Rondônia, Espírito Santo e Bahia. Atualmente, a prioridade é examinar o que está disponível, garantir a replicação em locais diferentes e reduzir eventuais excessos de duplicatas, de modo a facilitar a pesquisa e a melhoria genética, porém a busca por novos materiais terá continuidade tanto no Brasil como em outros países.
Blog- Uma curiosidade: a tecnologia usada pelos cacauicultores da amazônia é diferente da tecnologia usada pelos cacauicultores baianos? Que grau você daria a essa diferença?
Waldeck- Existem diferenças edafoclimáticas entre o Bioma Amazônia e o Bioma Mata Atlântica, que influenciam fortemente o cultivo e mesmo a agressividade de alguns fungos. O desenvolvimento da cacauicultura em outros biomas como no oeste da Bahia certamente propiciará o desenvolvimento e uso de outras tecnologias
Blog- Perante ao mundo as pesquisas da CEPLAC estão em pé de igualdade?
Waldeck- A CEPLAC se coloca em posição de destaque em relação à pesquisa da cacauicultura no mundo, porém consideramos fundamental a colaboração com centros de pesquisa relevantes de outros países como o Equador, por exemplo.
Blog- Há alguma pergunta que eu não fiz, mas você gostaria de falar?
Waldeck- É importante destacar o compromisso do MAPA, da SDI e da CEPLAC com o fortalecimento da cadeia produtiva do cacau e, nesse sentido, estamos trabalhando para a modernização da CEPLAC, com foco na pesquisa do cacau e uso intensivo de tecnologia, bem como para a construção de uma rede de pesquisa com participação de diversos atores do governo e da iniciativa privada para fazer frente aos importantes desafios que se impõem.
Blog- Falamos bastante de tecnologias. Numa próxima entrevista que assunto você gostaria de abordar?
Waldeck- Agradecemos a oportunidade de tratar desse tema tão importante que é a cacauicultura e permanecemos a disposição para responder às questões que o entrevistador encaminhar, afinal ele é quem canaliza as demandas do público e dos produtores.
Blog- Eu que agradeço! E fico feliz com sua disposição em conversar com os cacauicultores, deixar-se a disposição. Buscarei os assuntos mais interessantes aos cacauicultores. Foi um grande prazer fazer essa entrevista; muito obrigado.