Caros leitores,
Naquele sábado {27 de maio} daquele fatídico ano de 1989 eu cheguei à praia atrasado, era uma hora da tarde. Estava “mariado”, a noite de sexta-feira foi “a noitada!”. Ahhhh naquela Salvador a noite acontecia no (até hoje!) insuperável Casquinha de Siri; quem viveu gostou e quem não viveu perdeu. Sempre reservava a mesa na segunda fila próxima ao palco, de onde pontualmente a meia-noite eu assistia a banda baile Santa Rosa começar seu show, os caras arrasavam, tocava de tudo, era festa garantida. Todas às vezes eu mandava um gordo couvert artístico e pedia música; pois, neste dia, a charmosa cantora abriu o show com o meu pedido (Clara Nunes – Menino Deus) e ainda me mandou um abraço! Samba difícil de cantar e necessitado de excelente backing vocal; ficou nas minhas boas recordações. E assim meio passado, cantarolando “raiou, resplandeceu, iluminou” fui tomando água de côco quando do nada a casa caiu pra todo mundo, a nova namorada de Velhão voltou do banho de mar e seu biquíni branco estava transparente… imagine o climão no clube das luluzinhas!
Nada abalava Velhão, estava radiante e queria me convencer a só viajar para a fazenda após o dia dos namorados; contava casos e mais casos; do toca-fitas de seu indefectível Del Rey, como sempre, e invariavelmente, vinha à voz de Júlio Iglesias quando arrematou “passaremos em Itabuna, pode deixar, vou conversar com o presidente do CNPC1; tudo vai dar certo”. Daí começou a convidar um a um para passar uma semana em Caldas do Jorro, claro que todos declinaram; aquele biquíni transparente terminou em cultura, deu o que falar!
Já era possível vislumbrar o que aconteceria, entretanto passado 35 anos e tendo o tempo como senhor da razão, de fato tudo que previ aconteceu. Argumentava com Velhão que os cacauicultores eram excessivamente confiantes, excessivamente prudentes, excessivamente passivos, excessivamente legalistas, tudo isso fruto da harmonia dos relacionamentos pessoais e neste contexto, é impossível travar o bom combate; algo grave aconteceu e de alguma forma a harmonização social foi rompida. Onde estavam os GRANDES que dariam o bom combate, já que entre os políticos não tinha um só! Vamos lá, o segundo plano político era formado pela FAEB2 e pelo CNPC, onde, atrás das cortinas deste palco era travada uma briga de foice no escuro, movida por ciúmes, inveja, ganância e muito dinheiro. Assunta o diabo o Conselho Nacional dos Produtores de Cacau era a noiva rica, tinha uma magnífica sede, tinha garçons para servir cafezinho, tinha funcionários pra dar e emprestar, tinha automóvel (Opala Diplomata), tinha jetons para as reuniões, tinha apartamentos eternamente reservados no Itabuna Palace Hotel, tinha o tanto de espaço na imprensa que quisesse, tinha a assessoria de imprensa da CEPLAC3, e, é a jóia da coroa tinha elevador privativo para o presidente! Assim escancarando o que há muito tempo já acontecia, o presidente do CNPC estava apartado do cacauicultor, o assunto não mais era a cacauicultura, quem ditava a prosa era os “empalitozados”. Os funcionários que eram ceplaqueanos emprestados ao CNPC muito ajudaram a corroer internamente, e abriram as janelas para penetrar a fumaça de satanás. No CNPC materializou-se de forma visível como todas as engrenagens do “sistema” funcionou (sobre isso falarei em outro ensaio), então o presidente com tantos recursos, com prestígio junto aos cacauicultores, com votos suficientes para eleger o presidente da FAEB, quase um semi-deus, ficou covarde e nada fez. Nada!
A noiva pobre era a FAEB! Que não tinha dinheiro nem prestígio junto aos fazendeiros, até sua sede não foi comprada com doações voluntárias, foi um presente de Antônio Carlos Magalhães. A diretoria padecia com o poder, dinheiro e recursos do CNPC; desdenhavam e faziam pilhéria das reuniões com cafezinho servido na bandeja por garçom de gravata borboleta, tratavam a diretoria do Conselho por “eles lá”. Mas, porém, todavia, santo só existe na igreja e a tempestade perfeita estava formada, os faebianos tinham um segredo que não podiam dizer a ninguém; a constituição de 1988 criou o SENAR4. Com um prêmio deste tamanho na mão quem quereria falar de cacete de vassoura-de-bruxa! A vida deles estava resolvida e bem resolvida, o negócio agora era manter-se no poder até a definitiva implantação do SENAR. Assombrações terríveis tiravam o sono dos faebianos, já pensou se o CNPC resolve disputar um quinhão dos recursos; ou se o CNPC acordasse e resolvesse eleger toda a diretoria da FAEB e o conselho do SENAR! E assim o cacauicultor foi rifado, na FAEB só se pensava nos milhões do SENAR, o negócio era deixar o problema no colo do CNPC, coisa melhor não tinha, enquanto “eles lá” estiverem falando de cacete de vassoura-de-bruxa, esquecem o SENAR. A diretoria escolheu a vergonhosa omissão e talvez salvaram suas vidas financeiras, os salários sempre foram gordos, de brinde deixaram na história da cacauicultura sua mancha de mediocridade. O negócio certamente é bom, desde a implantação do SENAR em 1991 até hoje (33 anos) a FAEB só teve três presidentes.
Vi e vivi muito de tudo isso, eu estava dentro, participando. Os cacauicultores procuraram em vão um líder, em vão. Quanto à pergunta do motivo de não ter algum cacauicultor surgido e liderado, lembro-me do Cardeal Edmund Burke que escreveu: “Quando os homens maus se unem, os bons devem se associar. Caso contrário, cairão um após outro – sacrifício sem piedade em luta desprezível”. O tabaréu traduz assim: uma andorinha só não faz verão.
1-Conselho Nacional dos Produtores de cacau.
2- Federação da Agricultura do Estado da Bahia.
3- Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira.
4- Serviço Nacional de Aprendizado Rural.
Coronel Xela.
Respostas de 5
e assim caminha a humanidade, do cacau !!!
Realmente,jamais uma só andorinha faria um verão meu prezado Dorcas.
Não tenha dúvida, que os cacauicultores tem sua parcela de culpa no declínio da lavoura.
Não vivi esses momentos ,mas com certeza como obscuro produtor senti os reflexos da soberba , dos mandões e mandinhos e as ilusões q nos abraçavam e o mundo fragilizado anos passando e se acabando para os cacauicultores de raiz!
Infelizmente não mais retornará a legitimidade e honestidade dos q circundam o cacau e continuam tirando vantagens sangrando quem produz , apesar das ” explorações impostas…”
Verdade pura, estava na FAEB na década de 90, para desconstruir a região cacaueira, foi aberto e fortalecido diversos Sindicatos na região do entorno de Feira de Santana e mais a frente até a Cidade de Senhor do Bonfim, voltado a pecuária e outros cultivos e apenas um cala boca ao cacau, nomeações de alguns técnicos. Até hoje predomina na Presidência só Feirenses, com bastante recursos de imposto que pagamos e uma taxa é revertida ao CNA, FAEB/Senar
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